quarta-feira, maio 29, 2024

A MUSA DE BONNARD

California Filmes
No dia 6 de junho o filme “A Musa de Bonnard” chega aos cinemas brasileiros, com distribuição da California Filmes. O longa-metragem foi sucesso no mais recente Festival Varilux.
Dirigido por Martin Provost (A Boa Esposa), o longa acompanha o relacionamento de cinco décadas do pintor francês Pierre Bonnard (1867-1947) e de sua esposa, Marthe de Méligny (1869-1942). O homem que seu país natal apelidou de “pintor da felicidade” não seria o pintor que todos conhecem sem a enigmática Marthe que sozinha ocupa quase um terço da sua obra.
Vincent Macaigne (Vidas Duplas) e Cécile de France (Além da Vida) interpretam o pintor Pierre Bonnard e Marthe de Méligny.
Provost contou que, desde a infância, é encantado pela obra de Bonnard, em especial um quadro retratando Marthe, que chegou a colar uma reprodução da obra na parede de seu quarto. “Eu era muito jovem para entender isso, mas algo nesta imagem me fascinou, sua sensualidade e a estranheza. Era como se fosse uma janela que se abrisse para outro mundo.” E é esse clima que ele imprime em seu longa.
O filme surgiu quando o cineasta foi procurado por Pierrete Vernon, sobrinha-neta de Marthe, que queria um filme sobre sua ancestral. “Para ela, o seu papel de Marthe era fundamental no trabalho do marido e não foi suficientemente apreciado. Poderíamos dizer que Marthe se tornou o emblema e o fetiche disso, aparecendo em mais de um terço da obra do pintor. Mas ela permaneceu, para a opinião pública, uma pessoa perturbada e manipuladora, enquanto Pierrette via Marthe como uma mulher que sacrificou ela mesma pelo bem do trabalho de Pierre”, analisou.
Provost explica que reduzir Marthe ao papel de musa seria incorreto. “Como também seria enganoso e igualmente degradante reduzi-la a uma vítima impotente, devorada por um predador genial e juntando-se à longa lista de artistas famosos companheiras, objetivadas por um olhar masculino em sociedades ainda fundamentalmente patriarcais.”
Marthe tinha uma personalidade forte, e escondeu de Pierre partes significativas de sua vida passada, fazendo um nome e um personagem para si mesma. Ela vivia em uma mentira, mas ao mesmo tempo estava fugindo das falsas pretensões: era uma combinação de sinceridade e mitomania. Ao se retirar do jogo social, ela levou Pierre consigo, compartilhando seu amor pela solidão e pela natureza. Marthe poderia ter sido pintora. Com Pierre ao seu lado, seu desejo de pintar cresceu e um dia ela foi em frente, sob uma terceira identidade, Marthe Solange.
“Ao começar a trabalhar no roteiro, percebi que era uma história de amor comovente, escondendo por trás da lenda de seu relacionamento íntimo e falsamente isolado. Com Pierre e Marthe, nada era simples. Nem a doçura e o egoísmo de Pierre, nem a mitomania de Marthe, nem o papel decisivo que ela parecia ter desempenhado ao seu lado, e nem mesmo as pinturas de Pierre, nas quais, por trás de uma aparente representação de felicidade, cada detalhe é usado para desorientar ainda mais o público”, finalizou.
Veja o trailer: https://www.youtube.com/watch?v=1Ns9MKk8bwY

quarta-feira, maio 22, 2024

A FILHA DO PALHAÇO

Foto: Embaúba Filmes
“A Filha do Palhaço”, direção de Pedro Diógenes, acho erra no título. O correto seria “A Filha do Transformista” ou “A Filha da Drag Queen”. Mas talvez para não espantar o público, que nos últimos tempos, tem se mostrado mais e mais careta, usando um termo bem antigo, ou conservador, a escolha pelo palhaço.
Mas na realidade, o personagem Renato, vivido por Demick Lopes, não é um palhaço no sentido correto da palavra – não faz estripulias, brincadeiras infantis no palco. Renato encarna a drag Silvanelly, se apresentando em bares e teatros mequetrefes de Fortaleza, no Ceará. Canta, conta piadas, debocha da plateia, e assim vai levando a vida.
Até que certo dia recebe a visita de Joana (Lis Sutter), sua filha de 14 anos, e com quem tem pouco ou quase nenhum contato. Quando ele virou pai, abandonou a menina e a mãe dela por um homem – em determinado momento, Renato se abre para a garota, dizendo que foi uma paixão avassaladora e que ele não esperava se apaixonar por outro cara.
Joana quer passar um tempo com Renato, conhecer o pai, antes de uma mudança brusca em sua vida. Ele, que nunca teve cacoete para ser pai, começará de forma até meio inconsciente a agir como um – a cena em que Joana sai de casa, deixando o celular em cima da mesa, para dar uma volta na praia, exemplifica bem isso. Renato fica aturdido e bronqueia com a filha.
Os dois atores principais, Demick Lopes e Lis Sutter, irradiam carisma – ele, especialmente se destaca em cenas fortes e ousadas ao lado do coadjuvante Jesuita Barbosa, que vive Marlon, este sim um palhaço. “A Filha do Palhaço” é uma adorável história sobre um pai e uma filha que buscam se conectar.
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=53r_7P06mG4
Cotação: bom
Duração: 1h44min
Chico Izidro

sexta-feira, maio 03, 2024

A NATUREZA DO AMOR (Simple Comme Sylvain)

Imovision
“A Natureza do Amor” (Simple Comme Sylvain), direção de Monia Chokri, apresenta Sophie (Magalie Lépine Blondeau), uma professora de filosofia universitária de 40 anos, que mantém um relacionamento longo, estável e acomodado com Xavier (Francis-William Rhéaume). O filme se passa no Canadá, na parte de colonização francesa.
Em sala de aula, Sophie ensina sobre a teoria do amor baseada na obra “Retórica de Aristóteles” e outros filósofos para pessoas da terceira idade. Enquanto isso, adquire uma casa de campo junto com Xavier. E é aí que a sua vida vai mudar.
O casal contrata o marceneiro Sylvain (Pierre-Yves Cardinal), que vai cuidar dos últimos reparos da nova moradia deles. Porém, Sophie acaba se encantando com o jeito simples e quase rude do trintão, se apaixonando perdidamente. Os dois iniciam um relacionamento secreto, mas que aos poucos vai ficando mais forte.
Em determinado momento, Sophie decide largar tudo e assumir o namoro com Sylvain. Porém, apesar do amor verdadeiro que surge entre eles, nem tudo são flores. Enquanto eles mantiveram o caso extraconjugal, o mundo entre os amantes não entrou em conflito. No entanto, quando finalmente juntos, a vida deles é totalmente antagônica, e tudo começa a colapsar. O rapaz se mostra extremamente ciumento e possessivo, além do que fica gritante também a diferença cultural entre ambos.
Monia Chokri apresenta um roteiro bem amarrado, apresentando uma história de romance mais focada na realidade, sem muitos clichês. O roteiro ainda brinca com as aulas de Sophie, detalhando as várias fases que Sophie vive, pela visão filosófica de Platão, Schopenhauer, entre outros teóricos que falam do amor.
A questão dos opostos se atraem também é bem conduzida, mostrando ainda uma excelente química entre Sophie e Sylvain, personagens completamente opostos. Enquanto Sophie é uma pessoa intelectualmente sofisticada, Sylvain é um homem simples, que não consegue nem falar corretamente.
A trilha sonora é marcada ainda pelo clássico atemporal do Scorpions, “Still Loving You” (1984), do disco “Love at First Sting”, de extrema importância para Sophie.
Cotação: bom
Duração: 1h50min
Chico Izidro
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=-Jer0VrZKHM

quarta-feira, maio 01, 2024

“CONDUZINDO MADELEINE”

Foto: California Filmes
“Conduzindo Madeleine”, direção de Christian Carion, é um dos filmes mais emocionantes dos últimos tempos. Quando vi o título, pensei que seria algo no estilo “Conduzindo Miss Daisy”, de 1989, mas ainda bem que estava errado.
A trama se passa na linda Paris, cidade dos meus sonhos, e foca em Madeleine, de 92 anos, interpretada por Line Renaud, e o taxista Charles, vivido por Dany Boon. Ela vivia em sua casa, sozinha, até que as autoridades decidem que ela tem de ir para uma casa de repousos, pois não tem mais condições de se virar sem cuidados.
Então ela chama um táxi para levá-la à instituição de repouso onde irá morar, e aparece o estressado e desiludido Charles. Em suas últimas horas de liberdade, Madeleine quer passear por Paris, e ver os locais que marcaram a sua vida.
E durante o passado, a espirituosa Madeleine vai atraindo a atenção do fechado motorista, e revelando seu passado, de alegrias e tristezas. Como o filho que teve com um soldado americano tão logo acabou a II Guerra Mundial, o casamento com um homem abusivo, a prisão. A viagem de táxi irá aproximar os dois e marcar a vida de Charles para sempre.
Carion conta que quando leu o roteiro assinado por Cyril Gely caiu em lágrimas. “Todos nós enfrentamos esta questão um dia: o que acontecerá com nossos pais quando eles envelhecerem? A história de Madeleine saindo da sua casa para ir morar em uma instituição de repouso representa várias coisas para mim. Desde o início eu sabia que o filme foi escrito para Line Renaud”, lembrou.
Renaud definiu Madeleine como a personagem mais bonita que já interpretou. “Ela também é aquela que mais se parece comigo. Eu tenho a mesma idade de Madeleine, mas isso nem é tudo que temos em comum. Como ela, eu passei por algumas coisas difíceis na minha vida. Eu cresci perto de mulheres como ela na minha família. Madeleine é minha mãe, minha avó e até minha bisavó. Eu as vejo na história da minha personagem”, afirmou.
“Conduzindo Madeleine” é um filme extremamente cativante, emocionante. Bem, quando ele se aproximava de seu término, caí em um choro descontrolado. E tem ainda Paris, com suas belas ruas e prédios. A trama percorre várias décadas e mostra como houve evolução: a personagem de Madeleine não tinha voz nos anos 1950, ficando a mercê de um marido abusivo e não podia nem reclamar, pois a esposa era propriedade do homem. Sem mais...
Cotação: ótimo
Duração: 1h31min
Chico Izidro
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=Y4gLbrPe5iw

“VERISSIMO”

O sempre discreto e reservado escritor Luis Fernando Verissimo resolveu abrir as portas de sua casa, e durante 15 dias enquanto se aproximava de seu 80º aniversário, em 2016, deixou-se filmar. O resultado é o cativante documentário “Verissimo”, direção de Angelo Defanti. O filme começa de forma quase lenta, por vezes com o som quase inaudível e desinteressante. Mas aos poucos o dia a dia de Verissimo e sua família vai conquistando o espectador. Para quem acha que a vida de um famoso é glamour e reconhecimento público pode se decepcionar. O escritor é tão gente como a gente, que até achamos estranho. Ele anda pelas ruas, a escola dos netos, e não fosse um ou outro fã, quase passa imperceptível.
O universo de Verissimo não é novidade para Defanti que, em 2022, lançou a ficção” O Clube Dos Anjos”, baseado no livro homônimo do escritor, além dos curtas “Feijoada Completa” (2012) e “Maridos, Amantes e Pisantes” (2008), ambos a partir de contos do gaúcho.
As filmagens não pegaram apenas o octagenário, mas também o cotidiano de toda a família, com a presença constante da esposa Lucia e da netinha, e de sua paixão pelo Inter – detalhe, o documentário ocorre no ano do rebaixamento do clube à Série B.
Defanti lembra que toda a família acaba participando do filme. “Durante o mês das filmagens, fui rigorosamente todos os dias na casa. Para manter essa constância, compreendi logo que seria importante criar variações nos horários e nas atividades que registrava. Os 90 minutos do filme são fruto de análise de quase 100 horas totais de material. A proposta inicial era ter os últimos 15 dias de 79 anos de um homem e os primeiros 15 de 80”, contou.
“Na montagem, vimos que o dia do aniversário em si era o inevitável clímax da história, guardadas as devidas proporções que um sujeito pacato consegue viver de clímax”, explica Defanti.
O cineasta conta ainda que tentou se manter o mais discreto possível na casa dos Verissimos nas duas semanas, com uma equipe pequena composta por ele mesmo, e, eventualmente, uma outra pessoa. “Demorou muito pouco até a câmera e eu deixarmos de ser novidade e virarmos parte da paisagem da casa, como um abajur ou uma cor de parede. Estar no café da manhã um dia e no jantar no outro concedeu variação ao material, mas também baixou as guardas da família. Quando eu estava presente ou ausente, era mais ou menos a mesma coisa. Ainda que a relação tenha sido amistosa o tempo inteiro, tenho certeza que ficaram aliviados quando aquele mês chegou ao fim”, esclareceu.
Defanti completa, afirmando que o documentário mostra um lado de Verissimo pouco conhecido, mesmo para quem é fã de sua obra. O escritor é tímido, enquanto sua mulher, Lucia, é mais extrovertida. “O Verissimo encabulado de uma entrevista sendo tão ou mais retraído na vida eleva a observação do público a um outro patamar. Pois, se ele tem a obra irreverente da forma como todos conhecem e seus modos discrepam tanto dela, é natural buscar entrever a riqueza interior que certamente ocorre em sua mente. A persona pública e a persona íntima podem incrementar a visão sobre o autor e sua criatividade”, completou.
Cotação: Bom
Duração: 1h30min
Chico Izidro
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=TiQG5JQWDAY

“QUEER”

Foto: Paris Filmes “QUEER”, dirigido por Luca Guadagnino a partir de um roteiro de Justin Kuritzkes, é baseado em romance homônimo de 1985...