quarta-feira, março 27, 2013

“América - Uma história portuguesa”




Portugal, há muito tempo é território preferencial para os imigrantes brasileiros na Europa. Um dos principais fatores é a língua em comum. Em “América” não são só brasucas os despossuídos. Existe uma profusão de outras nacionalidades, como russos, ucranianos, africanos e até mesmo japoneses. Com direção de João Nuno Pinto, este filme instigante e ao mesmo tempo, quase contemplativo da vida no exterior, mostra um grupo de vigaristas, liderados por Vítor (Fernando Luis). Eles vivem de dar golpes em velhinhas viúvas, mas o negócio não está rendendo muito. O jeito é procurar outro golpe. E ele surge em falsificar documentos para imigrantes ilegais em Portugal. Mercado para tanto existe.

Mesmo sendo vigaristas com um grande público em potencial, vivem quase miseravelmente. Enfim, são uns pés rapados. Vítor ainda é casado com a russa Popova (Chulpan Khamatova, de Adeus, Lenin), e pai de um garotinho de cinco anos, Mauro, que se recusa a falar. Mulherengo, preconceituoso, dá pouca atenção para Popova, que passa a se engraçar com um médico ucraniano, que busca no Ocidente uma forma de recomeçar a vida, após perder tudo em Kiev.

Pinto não especifica onde se passa a ação, o certo é que é uma cidade litorânea de Portugal, assolada pelo mau tempo. Apesar de mostrar a crueza da imigração ilegal, das vigarices, “América” tem humor, principalmente com o personagem brasileiro Matias (Cassiano Carneiro, de Quem Matou Pixote?). A atriz Chulpan Khamatova, porém, é sublime. Ela não precisa falar muito para demonstrar o quanto sofre sua Popova, infeliz no casamento, no desterro. Seu rosto bonito e sofrido é um cartão de visita.

Cotação: bom
Chico Izidro

"Depois de Lucia”




O mexicano “Depois de Lucia” é perturbador, mesmo tratando de um tema já meio batido, o bullying. Dirigido por Michel Franco, mostra o reinício da vida de pai e filha, Roberta e Alejandra, que partem para a Cidade do México, após a morte da mãe da menina, Lucia, cujo nome não é citado em nenhum momento no filme. Na nova escola, Alejandra é recebida amigavelmente pela turma dos descolados, que desde os primeiros momentos revelam sentimentos abusivos ao zoar incessantemente com o gordinho. E acaba, numa festa de final de semana na casa de um deles, transando com um dos garotos, que filma a cena e envia para todos os outros colegas.

Alejandra vira a putinha do pedaço, e a ser fortemente discriminada pelos alunos. Mas em nenhum momento pede a ajuda de alguém. Sofre em silêncio, e passamos a esperar pelo pior. O bullying chega ao extremo quando lhe cortam os longos cabelos, e sabe-se, o cabelo de uma mulher é quase tudo. A depressão vem forte. O grande suspense de “Depois de Lucia” é sobre o que acontecerá...vingança? Ficará por isso mesmo? Ela se matará? Os minutos finais são angustiantes, praticamente não existe diálogo, e afinal, saímos abalados do cinema. A presença da garota Tessa Isa como Alejandra é fenomenal. Sendo adolescente, será que sofreu psicologicamente por representar sofrido papel? O filme é dela.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

"Os Croods"




"Os Croods", dirigido por Kirk De Micco e Chris Sanders, são uma família das cavernas, literalmente. Estamos na transição de um período geológico para outro, e a família de neandertais tem medo do exterior. O líder, Grug (no original com a voz de Nicolas Cage), toma todas as decisões. E uma delas é a sua família viver o máximo possível dentro de uma caverna, já que todas as outras famílias que ousaram se aventurar, acabaram morrendo. Seja devorados pelos dinossauros, ou por doenças. A adolescente Eep, típica da idade, é curiosa e insatisfeita com o modo de vida de sua família neandertal. Eep decide ousar e avançar um pouco mais no território hostil, quando acaba cruzando com um jovem de cérebro mais desenvolvido, um homo sapiens, e por ele se encanta. E por ele decide convencer a família para ir a um lugar mais seguro, já que os continentes estão se separando. Surgem então os confrontos de gerações entre pais e filhos.

A animação é excelente, e desde o seu início suas imagens impressionam, como quando os Croods saem para o café da manhã, na realidade uma verdadeira caçada, envolvendo os humanos, animais e um enorme ovo. E no desenho não importa a coerência com os fatos históricos. Os produtores não pouparam na criação de animais, como por exemplo uma tartaruga voadora. Importa aqui a primazia da trama, divertida, vertiginosa, e feita para o público entre os 8 e os 12 anos. Ou seja, o adulto que for assistir ao filme, tem que saber diferenciar a trama com os registros históricos, aqui atropelados.

Cotação: bom
Chico Izidro

“O Quarteto”




Dustin Hoffman, 74 anos, em sua primeira incursão na direção, não arrisca-se muito. Faz em “O Quarteto” um filme correto, bem contado, comovente e cercando-se, ainda, de um elenco de veteranos de primeira qualidade. Um olhar sobre a velhice, focando em quatro antigos astros do mundo da ópera, agora quase esquecidos num asilo para músicos no interior da Inglaterra.

Antes de entrar em cena o quarto elemento do filme, ele foca no mulherengo Wilf (Billy Connolly), na doce e mostrando os primeiros sintomas do mal de Alzeihmer Cissy (Pauline Collins) e o amargo e culto Reginald (Tom Courtenay). Eles passam os dias em atividades no retiro, praticamente seguindo ordens do mandão e afetado Cedric (Michael Gambon). E terão suas vidas remexidas quando chegar à casa a diva Jean Horton (Maggie Smith). Dona de humor incomum e cruel, e sentindo-se rebaixada por ter de abandonar sua casa, e não ter mais a voz de outrora, que lhe trouxe a fama, mas não fortuna, Jean deixará todos no asilo em polvorosa. Ainda mais quando fica-se sabendo que o local, em dificuldades financeiras, poderá ser fechado. O jeito é fazer uma apresentação para reunir donativos.

E porque os quatro não podem encenar a peça que os consagrou, Rigoletto, de Giuseppe Verdi. Só que Jean não quer participar, por não se achar mais em condições de subir ao palco. Sem contar que velhos ressentimentos vêm a tona, como o de seu relacionamento fracassado com Reginald, que não a suporta, e orgulhoso, refuta qualquer aproximação. Toda a história é contada de forma contida, sem histrionismos, e calculadamente certeira, mesmo que previsível, por Hoffmann. E quando a história terminar, não saia da sala. O novato diretor deixou uma bonita homenagem junto aos créditos aqueles que participaram de “O Quarteto”.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

"A Busca"




"A Busca", dirigido por Luciano Moura, é um instigante road-movie protagonizado por Wagner Moura. A trama parece não ter pé nem cabeça, e como disse meu amigo Yuri Correa, bastaria os personagens de Moura e Mariana Lima chamarem a polícia, que tudo estaria resolvido. Mas aí não haveria filme. E o filme trata sobre família, sobre ressentimento, perdão. O adolescente Pedro (Brás Antunes, filho do músico Arnando Antunes, autor da trilha sonora) triste com a separação nada amigável dos pais, some de casa após ter uma discussão com o pai, que indigna-se ao ver que ele ganhou uma cadeira do avô. E Theo, que não mantém relações com o pai há décadas, sente-se ultrajado ao ver o presente recebido pelo filho. (o filme deveria ter chamado originalmente A Cadeira do Pai).

Theo e Branca são obrigados a baixar a guarda um do outro para encontrar o garoto, que sabe-se logo, roubou um cavalo e sumiu no ar.... Theo deixa a bela casa classe média que construiu para a família, e que agora lhe incomoda, por não poder mais morar lá, e atravessa três Estados. Vai pelo caminho juntando as peças do quebra-cabeças para tentar localizar .... Na sua busca, onde também começará a ver a vida com os outros olhos e não somente materialmente – a cadeira, a casa -, Theo para numa favela, depois é acolhido por um morador de um barco, rouba o celular de um velhinho, e acaab num acampament hippie, onde ajuda num parto. E na trajetória, vai constatando de como seu filho está amadurecendo, ele próprio se vendo nas pistas encontradas. “A Busca” é simples, sem grandes atuações, mas simpático.

Cotação: regular
Chico Izidro


"Anna Karenina"




O primeiro pensamento ao término quase enfadonho "Anna Karenina", dirigido por Joe Wright, foi o de, pelo menos, os comunistas terem tomaram o poder na Rússia e eliminado aquela burguesada chata. Claro que o romance do grande León Tolstoi é mais do que isso. A história retrata a trágica história da nobre vivida pela inglesinha Keira Knightley, musa do diretor em seus filmes anteriores de época, "Desejo e Reparação" e "Orgulho e Preconceito". E me pergunto qual o fascínio que esta atriz exerce. Não é bonita, não sabe interpretar, é chata, seu choro é na realidade um quase afogamento. "Anna Karenina" é contada meio em forma de teatro. As passagens de um cenário para o outro são uma bela sacada. Praticamente filmado em estúdio, as únicas cenas fora mostram a fazenda do nobre Kostya Levin (Domhnall Gleeson).

A dupla principal não consegue segurar a dramaticidade exigida. É quase impossível acreditar que o comum Conde Vronski, interpretado pelo bom ator Aaron Johnson (de Kick-Ass), consiga encantar um séquito de nobres damas russas. Anna Karenina apaixona-se perdidamente por ele, decidindo arriscar perder todos os privilégios, inclusive de ver o filho pequeno, além de ficar estigmatizada como uma esposa infiel. Jude Law, por sua vez, tem uma ótima presença como o nobre corneado Alexei Karenin, e não importa-se em enfeiar-se nas telas, como já o fizera na ficção científica "Contágio". A história mais interessante é a de Kostya Levin, nobre que vivia no campo e não importava-se em misturar-se aos seus servos nas colheitas. A sua paciência e resignação em conquistar a jovem Kitty (Alicia Vikander), que o havia desprezado é comovedora. "Anna Karenina", enfim, é entediante.

Cotação: ruim
Chico Izidro

“Super Nada”




Ser ator não é só glamour, como pensam aqueles que vêm os atores famosos da Globo desfilando seus sorrisos nas revistas de fofocas. Tem o lado precário, quase famélico. Em “Super Nada”, de Rubens Rewald, um quase homônimo do crítico de cinema, vemos o dia a dia miserável do ator Guto (Marat Descartes, em atuação impecável). Ele vive de bicos para sobreviver e morando num quitinete vagabundo no centro de São Paulo, cuja pia do banheiro não funciona. O ator ganha a grana cotidiana participando de pegadinhas para a televisão, faz esquetes num teatro mambembe e não refuta nem mesmo ir para as sinaleiras fazer malabarismos com uma tocha.

E ainda é ajudado pela mãe, que também cuida de sua filha pré-adolescente – nunca é citado o que aconteceu com a mãe da menina. Fã do palhaço Zeca, um dia Guto começa a acreditar que sua sorte vai mudar ao ser convidado para fazer um teste no programa de tevê do ídolo, chamado de Super Nada. Aí vai descobrir que, às vezes, um ídolo nem sempre é como o idealizamos. Zeca, vivido esplendorosamente pelo cantor Jair Rodrigues, que faz um tipo mulherengo, bêbado e sequelado, apesar de saber, como diz certa hora, que seu programa é de quinta categoria, numa emissora de televisão de terceira.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

“A Parte dos Anjos”




O termo “A Parte dos Anjos”, que dá título ao novo filme de Ken Loach, significa a parte do uísque que evapora durante o processo de envelhecimento da bebida nos barris. Ou seja, ele teria sido bebido pelos anjos”, mais ou menos o que se faz no Brasil quando se joga uma gota da bebida no chão, para os santos. E de uísque, da adoração pelo uísque, e de regeneração é o que trata a obra.

A história gira em torno do marginal Robbie (Paul Brannigan), condenado a cumprir trabalho comunitário após quase matar um jovem a pancadas. Mesmo morando em Glasgow, ele nunca provou uma gota da bebida, e é introduzido na confraria pelo simpático assistente social Harry (John Henshaw), e acaba por descobrir ter o dom de ser um ótimo provador. Tentando se redimir, pois sua namorada recém deu-lhe um herdeiro, o pequeno Luke, Robbie quer começar vida nova. Mas sabe que é difícil deixar o lado marginal da vida, por mais que queira. Jurado de morte por uma gangue rival, Robbie descobre que determinado uísque pode lhe render uma grana preta. Ao lado de outros três deslocados, o grandão Mo, o quase retardado Albert e a batedora de carteiras Mo, Robbie decide aplicar um golpe e faturar alto, ficando sem problemas financeiros e assim começar vida nova ao lado da namorada e do filho.

Como sempre, Ken Loach, mesmo usando uma comédia leve como veículo, vai no caminho da crítica social, mostrando o lado decadente de Glasgow, com desemprego crescente, juventude perdida. Só que as soluções fáceis e atuações medianas acabam por enfraquecer o filme.

Cotação: regular
Chico Izidro

sábado, março 09, 2013

"As Sessões"


John Hawkes é aquele ator com cara de caipirão de vários filmes, incluindo o ótimo "O Inverno da Alma", de 2011, quando concorreu ao Oscar. E em "As Sessões", dirigido por Ben Lewin, ele está soberbo no papel do jornalista, filósofo e poeta Mark O'Brien (1949-1999). Que aos 38 anos de idade tinha um grande problema. Devido a poliomelite, que o imobilizou aos seis anos de idade, ele é virgem, e isso o atormenta redondamente. Além do que, é obrigado a passar a maior parte do dia dentro de uma máquina de respiração, caso contrário a morte chega em três horas. O sexagenário Lewin é também portador de polio e se locomove com uma bengala.

Inteligentíssimo, a carência pesa mais forte e Mark frequentemente apaixona-se, sendo rechaçadoconsegue ter movimentos apenas do pescoço para cima, mas não é tetraplégico, que não consegue ter sensações nervosas pelo corpo. Seu pênis tem vida própria, e por vezes, ao ser banhado por uma cuidadora, tem ereções e, para sua vergonha, ejacula. Católico praticante, tem conversas profundas e questionadoras com o padre de sua paróquia, Brendan (William H. Macy, excelente). As confissões de Mark, não raro, pertumbam o padre, já que focam o sexo. E estamos nos anos 1980, na Califórnia. Em determinado momento, Mark abre-se com o padre, pois deseja transar, mas como católico, como o fazer sem pecar, afinal não é casado. "Não foi por falta de tentativas", diz Mark a Brendan quando explica porque ainda é solteiro e virgem.

Então, o padre fecha os olhos para tal inusitada situação. Deus não irá se importar se um fiel não seguir a risca tal determinação. "As Sessões" chega em seu ponto principal. Liberado pela Igreja, como transar? Surge a figura da terapeuta sexual Cheryl Cohen Greene (Hellen Hunt, do seriado Mad About You). Ela vai ensinar a Mark a lidar com seu corpo e conseguir transar em seis sessões. E Cheryl repete: "Não é prostituta, é uma terapeuta". Hellen Hunt, quase cinquentona, não tem pudores nas cenas de nudez e sexo, muito bem conduzidas pelo diretor Ben Lewin, ele também portador de polio e se locomove com uma bengala. Cada momento é feito com delicadeza, que nada fica apelativo.

Outro trunfo é do humor. Não existe espaço para piedade. O personagem de Hawkes, apesar de sua deficiência, não inspira pena. Espirituoso, charmoso em sua condição, divertido, e mesmo quando carente, não induz ao choro. A similariedade com outro belo filme sobre deficientes vem à tona, o francês "Intocáveis". Os dois não são feitos para sentimentalismos baratos, apesar de seus personagens sofridos.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

"Oz Mágico e Poderoso"


Arrebatamento visual. Esta a impressão maior que tive ao final de "Oz Mágico e Poderoso", dirigido por Sam Raimi, e que conta a origem do personagem que entraria na vida de Dorothy, Espantalho, o Homem de Lata e o Leão Covarde, no clássico de Victor Fleming, de 1939. A história começa em 1905, quando Oz (James Franco, de 127 Horas), mágico mulherengo e picareta de um circo decrépito, tem de fugir para não ser morto por um artista traído e furioso. Na fuga, ele é envolvido por um ciclone e vai parar num mundo encantado, dominado por uma bruxa má.

Visto como salvador pela doce e romântica Theodora (Mila Kunis, de Cisne Negro), para provar não ser um vigarista, mas na realidade de olho num enorme tesouro, recebe a incumbência de salvar o reino mágico. Em sua aventura, ganha o reforço de um servil macaco alado, e uma doce menininha de porcelana, e uma bruxinha mais meiga ainda, ainda do que Theodora, Glenda (Michelle Williams, mais linda do que nunca). "Oz Mágico e Poderoso" é infanto-juvenil, não esconde isso. E fala sobre transformação, de tornar-se alguém melhor, além do que faz gancho perfeito com o clássico da década de 1930, que eternizou Judy Garland. Ah, eu ia falando de arrebatamento visual. Os 15 minutos iniciais são todos em preto e branco, passando ao colorido quando chega ao reino.

E o visual não é feito apenas para encher os olhos e enganar o espectador com um conteúdo vazio, como fazia o superestimado e chato "Avatar". Aqui tudo se completal, com a atuação de James Franco e a presença encantadora de Michelle Williams, Mila Kunis, cujo único problema é em sua maquiagem um pouco descuidada quando de sua transformação, e Rachel Weisz, encarnando perfeitamente o papel da bruxa má, Evanora, muito semelhante, aliás, a outra megera clássica, a rainha má de Branca de Neve. Raimi acerta ainda em seu climax final, evitando barbaridades guerreiras perpetradas em filmes como "Alice no País das Maravilhas", de Tim Burton, e "Branca de Neve e o Caçador", de Rupert Sanders, e com Charlize Theron e Kristen Stewart.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

"Hitchcock"


"Hitchcock", dirigido por Sacha Gervasi, não é uma cinebiografia convencional. Ao invés de contar detalhadamente a vida do diretor inglês, famoso pelo suspense em sua obra e o amor platônico por atrizes loiras geladas que protagonizaram suas películas, "Hitchcock" foca em um período específico da vida dele, quando da produção do genial "Psicose", no começo dos anos 1960. De como foi difícil para ele obter financiamento para o filme, já que sua produção anterior, "Intriga Internacional" não teve à época o reconhecimento, sendo massacrado pela crítica, público, e por Hitchcock ser considerado ultrapassado. O futuro diria o quanto estacvam equivocados. Ele teve de hipotecar sua mansão em Hollywood, e fazer outros cortes, como por exemplo, dispensar o motorista nos finais de semana, e diminuir a comida...sacrifício brutal para ele, glutão notório. "Psicose" ainda sofreu com a censura, com o desprezo inicial, por ser visto apenas como um filme de terror, e nada mais. E imaginem a mocinha ser morta na primeira meia-hora...

O obeso diretor é interpretado, e bem por Anthony Hopkins. O problema é a maquiagem problemática, com enchimentos na barriga e uma estranha prótese facial. Tirando isso, Hopkins tira de letra o humor inteligente e cínico de Hitchcock, que mantinha relação lá não muito saudável com a esposa, Alma, e aqui o show é de Hellen Mirren (A Rainha), simplesmente sensacional. Diz a lenda que em mais de 50 anos de casamento, eles tiveram somente uma relação sexual, que teria gerado a filha única Patricia.

"Hitchcock" tem liberdades narrativas. O diretor inglês tem visões e conversa com o serial killer Ed Gein, que em "Psicose" seria rebatizado de Norman Bates, eternizado pelo ator Anthony Perkins, homossexual enrustido como o personagem que encarnou, e que é vivido por James d'Arcy (de Mestre dos Mares - O Lado Mais Distante do Mundo). A produção perde força, no entanto, quando foca exageradamente na relação de Alma com o escritor Whitfield Cook (Danny Huston, o vampiro de 30 Dias de Noite). Seria mais interessante mostrar a tirania de Hitchcock com algumas de suas atrizes, mas aqui é apenas sugerido, pois o diretor vivia um momento de calma com a heroína de "Psicose", Janet Leigh, competentemente interpretada por Scarlett Johansson. A impressão também é de que Hitchcock seria um zero à esquerda sem Alma, menosprezando de certa forma a genialidade do cineasta.

Cotação: bom
Chico Izidro

“O Amor é Tudo do que Você Precisa”


Há muito não me emocionava tanto com um filme. E ele se chama “O Amor é Tudo do que Você Precisa”, dirigido pela dinamarquesa Susanne Bier. Além do título lembrando Woody Allen, além de partes filmadas em Copenhagen, transcorre quase em sua totalidade no paradisíaco litoral mediterrâneo da Itália. A história escorrega em alguns momentos, é deveras previsível, a trilha sonora, apesar de bonita, repete-se à exaustão, incomodando na décima vez que surge, ilustrando alguma cena onde um personagem reflete sobre a vida. Porém, é delicado ao mostrar a ressurreição de duas pessoas desesperançadas.

Ida (Trine Dyrholm, cativante) é cabelereira e casada há 20 e poucos anos com Leif (Kim Bodnia) e está finalizando um tratamento de câncer nos seios. Perdeu os cabelos, mas não a beleza radiante, emoldurada por um lindo sorriso e cristalinos olhos azuis. Sua filha mais velha vai casar e seu filho partirá para o exército. E o que acontece às vésperas do casamento da filha descobre estar sendo traída pelo marido, a quem dedicava atenção especial.

Já Phillip (Pierce Brosnan) é um mal-humorado empresário do setor frutigranjeiro, viúvo há duas décadas do amor de sua vida, e por isso fechado para qualquer relacionamento. “Decidi viver sozinho”, repete para as pretendentes. E seu filho, Patrick, é quem casará com a filha de Ida, Astrid, em sua mansão na Itália. Phillipe está bancando tudo. E quando conhece Ida, a antipatia é recíproca, os dois se digladiam, mas já podemos prever o resultado de tanta animosidade. Aos poucos eles irão se descobrir apaixonados, mas não querendo ceder, pois não querem se machucar mais do que se machucaram ao longo da vida.

Como pano de fundo deste romance maduro, o casamento da loira Astrid (Molly Blixt Egelind, uma atriz estranha. Quando de perfil, o ângulo não ajuda. Mas em compensação, de frente, um rosto belo, nórdico) e do jovem em dúvida Patrick (Sebastian Jessen). O casamento ainda traz um festival de tipos estranhos, como a cunhada de Phillipe, a rude Benedikte e sua filha adolescente rebelde Alexandra, a amante de Leif , a sem-noção Tilde, e o garçom Alessandro. Aliás, Phillipe e Benedikte protagonizam um forte e constrangedor embate na véspera do casamento. Lembrei imediatamente da cena em “A Fita Branca”, onde o pastor da aldeia destrata cruelmente sua governante e amante.

Cotação: ótimo
Chico Izidro

“Barbara”


Definitivamente o cinema europeu é superior ao de Hollywood. Inexistem os efeitos especiais e os roteiros são fechadinhos, inteligentes. No thriller político “Barbara”, dirigido por Christian Petzold, nos transporta, sem efeitos especiais, para a Alemanha Oriental do final dos anos 1970, uma década antes da queda do Muro de Berlim.

Barbara é vivida por Nina Hoss (excelente), médica que tentou emigrar do país comunista, e por isso foi presa, considerada inimiga do regime. Ao ser liberta, acaba exilada dentro da própria Alemanha proletária. Enviada para uma cidade à beira do congelante mar Báltico, e vigiada constantemente pela Stasi, a polícia política alemã, ela não desiste de planejar sua fuga para o Ocidente, contando para isso com a ajuda do namorado, que já vive no lado capitalista. Ele pode vê-la sempre, já que os ocidentais podiam entrar no lado oriental quando quisessem.

“Barbara” é tenso, a médica não sabe que é amigo, quem é inimigo, quem é indiferente. Ela está sempre olhando para os lados, escondendo seus pertences em algum buraco, praticamente neurótica. O filme também é severo com o regime que ruiu em 1989, ao mostrar a disparidade entre as pessoas dos dois lados do Muro. Duas cenas são emblemáticas. Numa, uma jovem observa, extasiada um mostruário de joias, sonhando em ganhar um anel do namorado. Noutro momento, um senhor baba de emoção e curiosidade ao ver um carrão Mercedes-Benz numa estrada, enquanto ele próprio dirige um Trabant, uma lata velha feita de alumínio e papelão fabricado pelos russos.

Cotação: ótimo

Chico Izidro

“Amigos Inseparáveis”


Esta em voga desde “Os Mercenários”, passando por “Red – Aposentados e Perigosos”, atores consagrados fazendo piadinha com suas idades avançadas, velhos e ultrapassados. Em “Amigos Inseparáveis”, dirigido por Fisher Stevens, Al Pacino e Christopher Walken não ficam imunes à palhaçada. Toda a história transcorre num período de 24 horas. Após 28 anos, Val (Pacino) é solto da prisão, e é recebido pelo único amigo que lhe restou no mundo, o resmungão e repetitivo Doc (Walken).

Este leva Val para conhecer o novo mundo, afinal foram quase três décadas cumprindo atrás das grades. Mas Doc não está ali de graça. Ele recebeu a missão de eliminar o melhor amigo, por ter matado acidentalmente o filho de um gângster, mas isso não importa para Claphands (Mark Margolis). Ele quer vingança, e põe Doc na parede, ou ele mata Val, ou será morto também.

Os dois velhos amigos passam as horas indo a uma lanchonete, onde Doc adora conversar com a garçonete que não dorme, vão a um bordel, onde Val brocha e retorna depois, após consumir várias pílulas de viagra, roubam um carro esporte, ajudam uma garota a se vingar de uns marginais que a estupraram. Tudo é tão irreal e forçado, que irrita. Ainda mais quando Pacino revive descaradamente seu personagem de “Perfume de Mulher”, ao dançar com uma garota numa danceteria, e depois sair por ai com um carrão...sem contar a chupação descarada de “Butch and Cassidy”, mas ai não posso falar qual cena. Pacino e Walken não precisavam disso.

Cotação: ruim
Chico Izidro

“Amanhecer Violento”


“Amanhecer Violento”, dirigido por Dan Bradley, é uma refilmagem modernizada do filme homônimo de 1984, estrelado por Patrick Swaize, Charlie Sheen, Jennifer Grey e Lea Thompson, com direção de John Millius. Na versão oitentista, os Estados Unidos eram invadidos por russos. Afinal, vivia-se a Guerra Fria. E um grupo de jovens de uma pequena cidade do meio-oeste refugiava-se nas florestas para combater o invasor.

Na nova versão, o inimigo é outro, são os norte-coreanos, que conseguem neutralizar o sistema de defesa dos States, e passam a dominar o país. Menos um grupo de jovens que, autointitulados Wolverines, refugiam-se na floresta que rodeia a cidadezinha. E dali tentam derrubar o inimigo, principalmente com atos terroristas. É até irônico ver uma garotada plantando bombas em ônibus, caminhões, prédios, fazendo emboscadas para mandar para os ares os asiáticos. Mas vão os iraquianos, afegães, arábes fazerem isso...

“Amanhecer Violento” mostra-se anacrônico, com atuações canhestras, onde destacam-se na mediocridade Chris Hemsworth, de "Thor" e o ex-gordinho Josh Peck (do seriado Drake and Josh), sem contar o vilão norte-coreano Capitão Lo (Will Yun Lee), com mais cara de sofredor do que um carrasco sob às ordens de Kim Jong-Un.

Cotação: ruim
Chico Izidro

“Dezesseis Luas”


“Dezesseis Luas”, dirigido por Richard LaGravenese, é realizado para ser a nova febre juvenil, após o término da insuportável cinessérie “Amanhecer”, com os vampiros mais patéticos da história. Bem que aqui a trama e os personagens têm um pouco mais de conteúdo. Tudo se passa numa pequena e conservadora cidade do sul dos Estados Unidos, onde a religião é tão forte, que muitos livros clássicos são censurados na escola local.

E é neste ambiente hostil que o jovem Ethan (Alden Ehrenreich, de Um lugar Qualquer e Tetro), irrequieto e sonhando em conhecer o mundão lá fora, apaixona-se perdidamente pela menina nova da escola, Lena (Alice Englert). E ela é discriminada pelas patricinhas caretas por ser de uma família antiga e considerada amaldiçoada no lugarejo. Os dois emendam um namoro, porém quando completar 16 anos, Lena, e isto está próximo, terá de sacrificar uma pessoa amada ou transformar-se numa bruxa má. E ela quer ser uma bruxa boa.

O casal protagonista tem mais estofo do que os chatérrimos Bella e Edward, mas também não possuem muito sal. Fraquinhos e feinhos, vão deixando o espectador bocejando ao longo do arrastado filme, em que pelo menos os efeitos especiais funcionam. Só que é triste testemunhar as participações bizarras dos ótimos Jeremy Irons e Emma Thompson no papel de bruxos, ele do bem e ela a maldosa da cidade. No mínimo precisavam de grana para pagar o aluguel. Uma nota de alento: os adolescentes de “Dezesseis Luas” leem livros, como obras de Bukowsky, e discutem sobre eles. Isso é impressionante.

Cotação: ruim
Chico Izidro


“Indomável Sonhadora”


Sinceramente não achei nada demais em “Indomável Sonhadora”, de Benh Zeitlin, cujo pai é brasileiro. A história, com toques de realismo fantástico, é claro, bem contada e filmada, mas...nada de extaordinário. O diferencial talvez seja mesmo a atuação do elenco, formado por amadores. Talvez seja mostrar que os Estados Unidos também possui seu lado miserável, aliás, bem miserável, como muita gente vivendo à margem da sociedade.

A trama fala da garotinha Hushpuppy, algo como bolo de milho, interpretada com correção pela novata Quvenzhané Wallis, que na época das filmagens estava com seis anos. A menina vive com o pai doente e alcoólatra numa miserável comunidade ribeirinha do sul dos Estados Unidos, que ela acredita ser o paraíso, pois o pai assim o fantasiou. Os habitantes desse povoado, batizado Bathtub, ou banheira, são negros, brancos, todos miseráveis, e que unem-se mais ainda após a passagem de um violento furacão que destrói tudo por perto. E o que não foi destruído ficou abaixo d’água. Quem não se mandou antes, morreu ou viu sua miséria triplicar.

Hushpuppy tem de ser mais forte do que sua pequena idade e ingenuidade indicam. No original, o filme intitula-se Beasts of the Southern Wild ou as bestas do sul selvagem e a garotinha tem sempre visões de enormes javalis à sua espreita, como tentando lhe mostrar que o local onde vive não é aquele paraíso pintado por seu pai. Quvenzhané é boa atriz por isso concorreu ao Oscar, perdendo-o para Jennifer Lawrence, de “O Lado Bom da Vida”. Mas a atuação espetacular de “Indomável Sonhadora” é do ator amador Dwight Henry, que vive Wink, o pai de Hushpuppy. Antes do filme ele trabalhava na região da Lousiana, assim como a maior parte do elenco. E não desaponta.

Cotação: bom
Chico Izidro

“Duro de Matar – Um Bom Dia Para Morrer”


Às vezes o retorno de algum herói icônico às telas mostra ser um tremendo equívoco. É o que acontece com o policial John McClane (Bruce Willis), em “Duro de Matar – Um Bom Dia Para Morrer”, dirigido por John Moore. Se os dois primeiros exemplares da cinessérie são clássicos oitentistas, quando McClane detonava terroristas primeiro em um edifício e depois num aeroporto, sempre com “charme”, o terceiro exemplar já dava sinais de cansaço pelas ruas de Nova Iorque. E na quarta parte, os vilões da vez eram terroristas cibernéticos, até com um final apoteótico. Mas neste quinto filme, o estrago é feito nas ruas de Moscou e na abandonada Prypiat, que hospeda a usina destruída de Chernobyil.

“Duro de Matar – Um Bom Dia Para Morrer” é de um absurdo absoluto. Não que num filme de ação se exija coerência, mas certas coisas abusam exageradamente da inteligência do espectador. McClane vai parar na Rússia atrás do filho, que acredita, seja um marginal e que encontra-se preso após tentar assassinar um figurão. Só que ao chegar a Moscou, o policial durão acaba descobrindo que o herdeiro, John McClane Jr. (o careteiro Jai Courtney, que também pode ser visto no mais recente filme de Tom Cruise, Jack Reacher - O Último Tiro) é na realidade um agente da CIA que está tentando tirar do país um criminoso conhecedor de segredos de um dirigente político, que tem o objetivo de chegar à liderança do governo.

E dê-lhe tiros, fugas impossíveis, dezenas de tombos que matariam qualquer ser humano, mas não McClane. Em determinado momento, ele e o filho pulam de um prédio de quase 20 andares, enquanto são metralhados...claro que nenhuma bala os atinge e sofrem apenas escoriações. De Moscou, a dupla parte para a contaminada Chernobyl, e sem roupas de proteção. Duro de acreditar!

Cotação: ruim
Chico Izidro

“QUEER”

Foto: Paris Filmes “QUEER”, dirigido por Luca Guadagnino a partir de um roteiro de Justin Kuritzkes, é baseado em romance homônimo de 1985...