quinta-feira, fevereiro 22, 2018

"Trama Fantasma" (Phantom Thread)



O novo filme de Paul Thomas Anderson marca a despedida do excelente ator Daniel Day-Lewis da indústria cinematográfica. Ele garantiu que está aposentado, depois de brilhar em dezenas de filmes, com destaque para "O Meu Pé Esquerdo", "Sangue Negro" e "Minha Adorável Lavanderia". Pois em "Trama Fantasma" (Phantom Thread), ambientada na Inglaterra dos anos 1950, ocorre um mergulho no universo da alta costura através do estilista Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis), um dos maiores especialistas na área.

O problema é que ele é um sujeito perfeccionista, vivendo apenas para a sua arte, nunca descansando e sempre escudado pela sua secretária particular Cyrill (Lesley Manville). Até que seu mundo fica abalado quando conhece a jovem Alma (Vicky Krieps), uma garçonete que chama a sua atenção e logo vira modelo exclusivo das criações de Reynolds. O problema é que ele não quer abrir seu coração para a jovem, mesmo que ela mexa com suas estruturas. E nunca fica claro se Reynolds foge da garota por, talvez ser homossexual, ou por não querer nenhuma alteração em seu estilo de vida.

O filme vai bem até próximo do final, quando começa a desandar. O diretor parece não saber exatamente como terminar sua obra, perdendo um pouco o rumo. O término é aquele...como? acabou? é isso?

Duração: 2h11min
Cotação: bom
Chico Izidro

"A Grande Jogada" (Molly‘s Game)



Você gosta de pôquer ou quer aprender? Então assista "A Grande Jogada" (Molly‘s Game), direção primorosa de Aaron Sorkin, que mostra os segredos do jogo, os esquemas clandestinos de jogatina. A obra é baseada em fatos reais, narrados em livro homônimo da própria Molly Bloom, aqui vivida por Jessica Chastain.

Toda a trama é narrada em forma de flash-back, desde o tempo em que Molly se preparava para participar dos Jogos Olímpicos de Inverno como esquiadora. Acidentada e impossibilitada de competir, a protagonista deixa a família, liderada por um pai repressor e exigente interpretado por Kevin Costner, e se muda para Los Angeles para tirar um ano de folga antes de entrar na faculdade.

Mas no meio do caminho ela acaba sendo contratada como assistente de Dean Keith (Jeremy Strong), um produtor de cinema, que também organizada carteados clandestinos, com muitos clientes famosos e ricos, muitos deles atores e diretores de cinema. Logo Molly começa a aprender os macetes e ganhar muito dinheiro, possibilitando que ela própria passe a organizar as noitadas de pôquer. Só que acaba caindo nas garras do FBI e tendo de recorrer a um advogado de celebridades, Charlie Jaffey (Idris Elba) para escapar da cadeia.

Então o filme passa a ser um suspense de tribunal - a dobradinha Idris Elba e Jessica Chastain, que tem em mãos um dos grandes papeis femininos da temporada, está ótima. A sintonia entre ambos é o ponto alto do filme, garantindo boas cenas. Enfim, "A Grande Jogada" (Molly‘s Game), é uma obra sobre ascenção e queda, que surpreende.

Duração: 2h20min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Pequena Grande Vida" (Downsizing)



"O Incrível Homem que Encolheu", "Querida, Encolhi as Crianças" e "Homem-Formiga" são exemplos de filmes onde os personagens são reduzidos a poucos centímetros de altura. A mesma linha se insere "Pequena Grande Vida" ( Downsizing), direção de Alexander Payne, que aqui pretende não fazer comédia, mas uma obra de ficção científica com certo grau de crítica social.

O filme tem início quando um cientista obtém sucesso em experimento para deixar as pessoas com poucos centímetros. Assim, diminutos, os seres humanos consumiriam menos recursos naturais e evitariam ainda o problema da superpopulação. Bem, ecologia. Além disso, quem se submetesse ao processo de encolhimento teria grandes vantagens financeiras. Assim, Paul Safranek (Matt Damon), entediado com sua vida e endividado, decide encarar o processo ao lado da mulher Audrey (Kristen Wiig). Porém a mudança acaba não ocorrendo como ele planejara.

Paul, então, tem de reestruturar toda a sua vida num mundo miniaturizado, e fazer novas amizades, como a do excêntrico playboy Dusan Mirkovic (Christoph Waltz). E neste novo mundo, o protagonista descobre que nem tudo é glamour, ao conhecer a empregada doméstica Ngoc Tran Lan (Hong Chau), que perdeu uma das pernas e vive em uma espécie de favela neste pequeno mundo.

O filme acaba se transformando em uma sátira social, mas vai perdendo força no seu decorrer. Sendo que em certo momento simplesmente a questão da miniaturização é deixada de lado. Além disso, é interminável, com mais de duas horas desnecessárias.

Duração: 2h16
Cotação: regular

Chico Izidro

"Pantera Negra" (Black Panther)



O "Pantera Negra" (Black Panther), direção de Ryan Coogler, é o segundo herói negro a pintar nas telas, depois de Blade, que foi lançado em 1998. Mas nas histórias em quadrinhos, o africano é anterior, surgido nas revistinhas em 1966, enquanto que o caçador de vampiros é de 1973. Depois disso, vamos lá, apesar de toda a grita que se está fazendo em cima do personagem, ele não me representa. Tá, tudo bem, resgata o orgulho africano, num filme que tem quase 98% de atores afro-americanos, e mostrando um país prá lá de evoluído, ao contrário da realidade da pobreza do continente, muito por causa da colonização e também de governos corruptos.

Neste filme, vemos a luta de T‘Challa (Chadwick Boseman), que herdou o trono do reino fictício de Wakanda após a morte do pai, T’Chaka - evento visto em “Capitão América: Guerra Civil”, assume o poder do país. A riqueza local é o poderoso metal Vibranium, mas cujo conhecimento o mundo não tem, afinal se descobrisse, o país seria alvo de especuladores. Para o mundo, Wakanda se mostra pobre, mas atrás de suas montanhas e vales, encontra-se uma civilização moderna e além de seu tempo, com muito conhecimento tecnológico.

Claro que as coisas não serão fáceis para T'Challa, que ao assumir o trono, começa a descobrir um passado de pecados de seu pai, e o surgimento de um parente, o jovem Erick Killmonger (Michael B. Jordan), que quer assumir o reinado, se vendo como herdeiro legítimo. Os dois acabam entrando em conflito, assim como todas as tribos que formam Wakanda.

Ao contrário de outros filmes da Marvel, "O Pantera Negra" carece de humor. Os personagens passam o tempo todo sisudos. Mas é uma obra com bons diálogos e boas atuações, com destaque para o elenco feminino, com destaque para Letitia Wright (Black Mirror), que interpreta Shuri, a irmã do protagonista e gênio da tecnologia, uma espécie de Q dos filmes do James Bond, a bela Lupita Nyong’o e Danai Gurira, de "The Walking Dead", como guerreiras.

O figurino é ok, mas para que mostrar africanos o tempo todo dançando e tocando tambor e aquela música tribal infernal como pano de fundo? Africanos só dançam e fazem magia? Putz...

Duração: 2h15min
Cotação: bom

Chico Izidro

quinta-feira, fevereiro 15, 2018

"Três Anúncios para um Crime" (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri)



"Três Anúncios para um Crime" (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri), direção de Martin McDonagh, mostra a batalha de uma mãe por justiça, lutando contra a ineficiência ou seria descaso da polícia? Mildred Hayes (Frances McDormand, mais uma vez magnífica), após esperar por mais de sete meses o esclarecimento sobre o assassinato de sua filha adolescente, e não vendo respostas, decide alugar três outdoors numa estrada na entrada da cidade, aonde coloca frases pedindo respostas para o crime e denunciando a ineficiência do delegado Bill (Woody Harrelson).

A partir daí, Mildred passa a ser tratada como uma pária social em Ebbing, sofrendo perseguição dos policiais, que se sentiram ofendidos com a atitude dela. O pior deles é Jason Dixon (Sam Rockwell, excepcional), um homem que ainda mora com a mãe e é racista ao extremo, atacando não só a Mildred, mas também os amigos dela.

Aos poucos, a situação vai fugindo do controle tanto de Mildred, quando dos policiais, e uma cena forte destaca toda a desesperança de Bill, mas não vou dar spoiler!!! Enfim, todos os personagens de "Três Anúncios para um Crime" não são totalmente bons, nem totalmente ruins, mas todos com qualidades e defeitos. Todos os atores têm seus momentos para brilhar e o fazem com muita força - a virada na parte final é algo único.

Duração: 1h55min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Mudbound - Lágrimas Sobre o Mississippi" (Mudbound)



"Mudbound - Lágrimas Sobre o Mississippi" (Mudbound), da diretora Dee Rees, é baseado no romance homônimo de Hillary Jordan, e tem como pano de fundo o miserável sul dos Estados Unidos nos anos 1940, onde imperava a segregação racial, violência, machismo, misoginia e pobreza. O filme mostra como duas famílias tentam se virar em um ambiente hostil.

Vemos duas famílias protagonistas, uma de brancos, onde se destaca Laura (Carey Mulligan, de As Sufragistas e sósia de Katie Holmes), casada com Henry (Jason Clarke, de Os Infratores). Os dois deixam a cidade para ir morar numa fazenda e logo descobrem que entraram numa roubada. Outro personagem importante da trama é Jamie (Garrett Hedlund), irmão de Henry, que retorna da Segunda Guerra Mundial destruído e alcoolatra, mas mesmo assim dono de um bom coração.

A outra família de negros vive na fazenda de Henry como se estivesse ainda na época da escravidão, trabalhando numa terra que não é sua. Nela se destaca o jovem Ronsel (Jason Mitchell, de Straight Outta Compton: A História do N.W.A.), o filho mais velho de Hap Jackson (Rob Morgan). Ele lutou na Segunda Guerra Mundial, onde conheceu um outro mundo, onde não importava a cor de sua pele, apesar de ele ter lutado contra os nazistas. Ao voltar para casa, nada mudou e sua atitude é vista como arrogante pelos racistas locais. E ele vai fazer amizade com Jamie, o que desencadeará sérios problemas.

A trama é forte, pesada, chegando a incomodar, pois é tudo tão cruel, tenso, que ficamos imaginando como que um dia homens podem ter tratado outros de uma forma tão absurda e abjeta apenas por causa da cor de pele diferente.

Duração: 2h14min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Eu, Tonya" (I, Tonya)




"Eu, Tonya" (I, Tonya), direção de Craig Gillespie, mostra de forma quase cômica a trajetória da patinadora olímpica Tonya Harding, que tentou de todas as formas o sucesso em sua carreira, mas sempre tropeçou por não se enquadrar no sistema exigido pelo esporte. Além disso, sua vida ficou marcada por seu marido ter organizado um atentado contra a principal concorrente de Tonia, Nancy Kerrigan, às vésperas das Olimpíadas de Inverno de 1994.

Tonia é interpretada de forma magistral, primeiro na infância por Mckenna Grace, e depois na adolescência e fase adulta por Margot Robbie. A garota, desde pequena, mostrou grande capacidade para patinadora, mas isto fez com que sua mãe, LaVonna (Allison Janney) agisse de forma quase brutal com ela, exigindo o máximo e até mesmo a tirando da escola. Sua vida deveria ser toda focada na patinação. Aos 15 anos, Tonia conseguiu se livrar das garras abusivas da mãe, mas acabou num casamento mais abusivo ainda com Jeff Gillooly (Sebastian Stan), que anos depois seria o provocador de um dos maiores escândalos esportivos.

"Eu, Tonya" é uma cinebiografia criativa, onde os personagens, muitas vezes, falam direto para a câmera numa espécie de mockumentary (documentário falso), mas também interrompem a atuação, para falar diretamente com a plateia.

O desempenho de Margot Robbie, atriz australiana, de 27 anos, é de extremo talento, ela conseguindo fazer a personagem com 15 anos e depois com 40, seja com desespero, graça, sapequice (se é que existe esta palavra!). Allison Janney no papel da mãe abusiva de Tonia, também está excelente. A gente não sabe se a odeia, ou se sente pena daquela mulher patética.

Duração: 2h
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Lady Bird - A Hora de Voar" (Lady Bird)




"Lady Bird - A Hora de Voar" (Lady Bird), temos a estreia na direção de Greta Gerwig (atriz de Frances Ha e Para Roma, com Amor), onde ela mostra a vida da adolescente Christine McPherson (Saoirse Ronan), de 17 anos e que está em seu último ano no ensino médio e tendo como objetivo cursar uma faculdade o mais longe possível de Sacramento, Califórnia, onde mora com a família. E ela tem atitudes meio excentrícas, gostando de ser chamade de Lady Bird.

Gerwig mostra este período na vida de Christine - a trama se passa em 2002. Ali vemos a garota envolvida em seu primeiro namoro, os problemas na escola católica onde estuda, as divergências com a mãe, que não a quer morando longe.

Laurie Metcalf interpreta Marion McPherson, mãe de Christine, que é obrigada a enfrentar uma dupla jornada no trabalho, enquanto o marido está desempregado, mas é o grande herói para a filha.
"Lady Bird: É Hora de Voar" mostra o crescimento de um personagem. No entanto, o filme não empolga, se mostrando frio, com situações corriqueiras muitas vezes vista em outras obras similares. Acaba sendo, por vezes, tedioso.

Duração: 1h35min
Cotação: bom

Chico Izidro

"Lou" (Lou Andreas-Salomé)



Dirigido por Cordula Kablitz-Post, o filme "Lou" (Lou Andreas-Salomé) pretende mostrar a vida atribulada da escritora e psicanalista russa Lou Andreas Salomé, que, no fim do século XIX, ficou conhecida por conquistar, com suas posições políticas e de vida, pensadores brilhantes da época, como o filósofo Friedrich Nietzsche e o psicanalista Sigmund Freud. Ela é pouco conhecida no Brasil e autora prolífica, não tem sua obra traduzida para o português.

Apesar de todo o seu modo de viver a vida nos rígidos finais do Século XIX, a cinbebiografia acaba sendo muito convencional, mostrando mais o lado amoroso de Lou, que teve um triângulo amoroso com os filósofos Paul Rée e Friedrich Nietzsche, mas sem nunca ceder a nenhum deles. Assediada por um pastor em sua adolescência, ela teria jurado nunca se apaixonar ou se casar. Mas cairia mesmo de amores pelo poeta Rainer Maria Rilke.

A diretora Cordula Kablitz-Post acaba ousando pouco, sendo que Lou foi uma mulher à frente de seu tempo, transgressora, que não aceitava as normas machistas, mesmo por parte das mulheres. Post perde muito tempo com os momentos sentimentais. Mesmo assim é de se aplaudir as atrizes Katharina Lorenz e Nicole Heesters, que interpretam Lou na fase adulta e na velhice, respectivamente. Outra coisa a se destacar é a fotografia e a bela reconstituição de época.

Duração: 1h43min
Cotação: bom

Chico Izidro

quinta-feira, fevereiro 08, 2018

"O Que Te Faz Mais Forte" (Stronger)



No ano passado, "O Dia do Atentado" reproduziu fielmente o ataque terrorista na Maratona de Boston em 2013, que vitimou três pessoas e feriu mais de 250. Agora, em "O Que Te Faz Mais Forte" (Stronger), direção de David Gordon Green, e baseado no livro de mesmo nome, escrito por Jeff Bauman e Bret Witter, é mostrado o que aquele atentado afetou as vidas humanas, principalmente na figura do próprio Jeff Bauman (vivido por Jake Gyllenhaal).

Jeff foi pego pelo destino, pois nem deveria estar presente no local de uma das explosões, mas ele foi lá para incentivar Erin Hurley (Tatiana Maslany), uma garota com quem ele mantinha um relacionamento amoroso marcado por idas e vindas. O jovem foi testemunha ocular, ao conseguir identificar um dos irmãos que praticaram o atentado, mas antes sofreu o pior, quando ele estava próximo a uma das bombas, e acabou perdendo as duas pernas. Assim como outros sobreviventes, ele se tornou um dos símbolos do slogan Boston Strong, criado para apoiar familiares de vítimas e mortos no atentado terrorista.

O filme acaba por tratar sobre os efeitos do atentado em famílias, em relacionamentos. Jeff teve de superar depressão, interesseiros que queriam se aproveitar de sua tragédia pessoal. E reaprender a caminhar, enfim a viver. Jake Gyllenhaal entrega uma atuação digna, fazendo um trabalho espetacular, mostrando aquele olhar de quem perdeu muito, mas precisa se recuperar, apesar dos percalços.
"O Que Te Faz Mais Forte" consegue fugir da armadilha que é cair, neste tipo de filme, em chantagens emocionais. O diretor David Gordon Green consegue acertar em realizar um drama forte, sem apelação.


Duração: 2h
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Sem Amor" (Loveless)




Um drama intenso, mostrando o descaso de um casal com seu filho é o que encontramos em "Sem Amor" (Loveless), do diretor russo Andrey Zvyagintsev. A trama mostra o casal Zhenya (Maryana Spivak) e Boris (Aleksey Rozin) que estão se separando em meio a muitas discussões e pior, eles tem um filho de 12 anos, Alyosha (Matvey Novikov), que é simplesmente negligenciado por seus pais. E cada um deles está reconstruindo a vida com novos pares, sendo que Boris já está esperando um outro filho com a nova namorada.

E tanto Zhenya quanto Boris não querem ficar com Alyosha. Um dia o garoto escuta nova discussão e simplesmente desaparece. Mas passam mais um par de dias para os seus pais notarem sua ausência. A partir daí o que temos é uma procura pelo garoto, e é quando Zhenya e Boris notam que não sabem nada, mas nada sobre seu filho. Se tem amigos, o que faz, como está na escola, o que não faz.
A polícia, no início, também se mostra desinteressada pelo caso, mas aos poucos é formado um grupo de socorristas para tentar encontrar Alyosha.

Enfim, o filme trata da falta de amor, da indiferença, desprezo. "Sem Amor" (Loveless) é melancólico, e angustiante, até mesmo para o espectador, que fica sofrendo para saber o desfecho sobre o sumiço do garoto. Triste.

Duração: 2h08min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"O Insulto" (L'insulte)



O filme libanês "O Insulto" (L'insulte), do diretor Ziad Doueiri, mostra que as feridas religiosas e étnicas ainda estão abertas passados mais de 25 anos do final da guerra civil que devastou o Líbano nos anos 1970 e 1980. Toda a trama começa por causa de um mal-entendido ocorrido em um bairro simples de Beirute, capital do país e que um dia ficou conhecida como a “Paris do Oriente Médio”.
O ponto de choque são dois homems, o mecânico libanês e cristão Toni (Adel Karam) e o refugiado palestino Yasser (Kamel El Basha), que trabalha numa empreiteira que presta serviços a um deputado consertando logradouros da cidade. Um dia Toni está molhando suas plantas em sua varanda ilegal e acaba molhando Yasser, que se propõe a consertar a calha, que está estragada. O libanês não concorda, mas mesmo assim Yasser toma a liberdade de fazer o conserto, logo destruído por Toni.

Os dois então passam a trocar insultos, sendo que Yasser dispara: "seu babaca do caralho" para Toni. O libanês passa, então, a exigir desculpas por parte do palestino. As coisas vão piorando e Toni devolve a ofensa, mas desta vez, xenófoba: "Pena que Ariel Sharon não acabou com vocês!", referindo-se ao líder israelense.

A partir daí, os acontecimentos vão ficando piores, mais extremados e cada vez mais minando a paz das duas famílias até levar todos aos tribunais. Logo cristãos libaneses e palestinos estarão se agredindo pelas ruas de Beirute, e as lembranças da guerra civil voltam à tona.

As atuações dos dois protagonistas são fortes, diria excelentes. Adel Karam constrói em Toni uma pessoa explosiva, nervosa, impulsiva e sem pensar muito nas consequências de suas palavras e atos. Já o Yasser de Kamel El Basha é o contrário. Um personagem que sofreu perseguição, é um deslocado, sem lar, e introspectivo, e mesmo se sentindo injustiçado, não consegue expor seu sofrimento, se defender de forma correta. Um retrato forte e cruel do mundo de hoje e ontem, e infelizmente, de amanhã.

Duração: 1h52min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

"Todo o dinheiro do mundo" (All the Money in the World)




O veterano diretor Ridley Scott reconstitui em "Todo o dinheiro do mundo" (All the Money in the World) um dos sequestros de maior repercussão no mundo nos anos 1970, envolvendo então a família do homem mais rico do planeta, John Paul Getty (interpretado espetacularmente por Christopher Plummer, que teve de refazer as cenas no lugar de Kevin Spacey, demitido após vir à tona seus escândalos sexuais).

Seu neto, Paul Getty (Charlie Plummer e nenhum parentesco copm Christopher) é sequestrado em Roma por uma gangue calabresa, que pede o resgate de 17 milhões de dólares. Mas JPG se nega a pagar, alegando ter vários netos e que se pagasse o resgate, teria de ver outros sequestros e mais gastos. O detalhe é que Paul era filho de Gail (Michelle Williams, explendorosa), nora de JPG e sem um centavo no bolso - mas claro que os sequestradores não queriam nem saber.

A trama se arrastou por vários meses, e teve ajuda nas investigações de um auxiliar de JPG, Fletcher Chase (Mark Wahlberg). Sem o resgate pago, o garoto acabou sendo vendido pelos sequestradores à máfia calabresa, pior e mais violenta, que tirou a orelha direita de Paul e a mandou como prova de que se o dinheiro não fosse liberado, coisa pior aconteceria com o jovem, então com 16 anos - mais não dá para contar, para não quebrar o clima de suspense.

Mas Ridley Scott faz um trabalho meticuloso de construção de um personagem para quem as pessoas importavam pouco. JPG queria mais e sempre mais dinheiro, perdendo muito de sua humanidade - se é que um dia chegou a ter. E Christopher Plummer, do alto de seus 88 anos, consegue transmitir todo o egoismo e frieza do então homem mais poderoso do planeta.

Duração: 2h02min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

quinta-feira, fevereiro 01, 2018

"A Forma da Água" (The Shape of Water)




"A Forma da Água" (The Shape of Water), é a nova obra de Guillermo del Toro, único do trio de diretores mexicanos que ainda não possui um Oscar - Alejando González já levou a estatueta duas vezes, por "Birdman" e "O Regresso", e Alfonso Cuarón foi premiado por "Gravidade" e "E Sua Mãe Também". Mestre do cinema fantástico, com trabalhos como "O Labirinto do Fauno", "A Espinha do Diabo", "Mutação" e "A Colina Escarlate", del Toro faz aqui uma homenagem ao clássico "O Monstro da Lagoa Negra", de 1954, e um dos favoritos dele. O visual do ser aquático e o modo como a história é trabalhada remetem direto ao filme dos anos 1950.

Na trama, acompanhamos a vid quase solitária da faxineira de uma instalação militar, Elisa (Sally Hawkins), que é muda e que divide o apartamento, acima de um cinema falido, com Giles, um pintor fracassado e gay enrustido, que sobrevive de pinturas que faz aqui e ali. No trabalho, ela tem como amiga Zelda (Octavia Spencer), uma divertida faxineira que compensa o silêncio de Elisa falando sem parar quase um minuto e que traduz o que a colega tenta transmitir.

Um dia Elisa acaba encontrando em um laboratório de pesquisa uma estranha criatura marítima, que é objeto de pesquisa dos militares, e acaba se afeiçoando do monstro, interpretado por Doug Jones. Ele é violentamente tratado pelo Coronel Strickland, vivido por Michael Shannon. Aos poucos, Elisa vai começar a bolar um plano para libertar o homem-peixe, por quem se apaixona, visto que são duas criaturas, mesmo que de espécies diferentes, mal-tratadas pelo mundo e objeto de estranheza - ela por sua mudez, o monstro por sua aparência.

"A Forma da Água" (The Shape of Water) se passa nos turbulentos anos 1960, em pleno período da Guerra Fria - os russos também almejam em sequestrar a criatura dos americanos - e que trata ainda do machismo e do forte racismo da época, muito presente na figura do Coronel Strickland, que não entende que todo o mundo a sua volta está começando a mudar, mas continua agindo com radicalidade e intolerância.

Sally Hawkins está excepcional no papel da protagonista. Sem dizer uma única palavra em todo o filme, ela consegue transmitir com olhares e gestos todo o sofrimento de seu personagem. Já Octavia Spencer e Michael Shannon praticamente dispensam comentários - são excepcionais atores, sempre fantásticos em seus papéis. Ele mais uma vez como vilão, é assustador e mais monstruoso que a própria criatura aprisionada. "A Forma da Água" é um conto de fadas para adultos.

Duração: 2h02min
Cotação: ótimo

Chico Izidro

“QUEER”

Foto: Paris Filmes “QUEER”, dirigido por Luca Guadagnino a partir de um roteiro de Justin Kuritzkes, é baseado em romance homônimo de 1985...